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domingo, 27 de novembro de 2011

A INTERNET ESTÁ NOS IDIOTIZANDO?

FONTE: REVISTA VEJA

O americano Nicholas Carr, 52 anos, é formado em inglês e fez mestrado em literatura americana. Com uma prosa extremamente eficiente, Carr tomou-se escritor de não ficção. Escreve livros sobre cultura, economia e, especialmente, tecnologia. Quando a maioria das pessoas só via os benefícios da internet e as maravilhas do Google, Carr publicou um artigo na revista The Atlantic dizendo que, talvez, a rede mundial estivesse nos idiotizando. Ele contava que, como usuário intensivo da internet, vinha observando que sua capacidade de concentração e contemplação já não era a mesma. Ler um livro estava virando um sacrifício. Hoje, três anos depois, o escritor acha que melhorou um pouco, mas à custa da redução do seu tempo on-line. "Mudei alguns hábitos", diz. "Fechei minha conta no Twitter e no Facebook. Os dois prestam um serviço útil, mas provocam muita distração, mandando mensagens o dia inteiro." Agora, com a pesquisa que mostra que o Google pode estar afetando o modo como a memória humana funciona, Carr sente-se como se já soubesse disso. Do estado do Colorado, ele falou a VEJA por telefone e disse que seu li­vro mais recente, The Shallows, que trata dos efeitos da internet sobre o cérebro humano, deve ser lançado no Brasil neste ano. Quando quis saber o nome da editora brasileira, Carr deu uma resposta que vale a leitura da en­trevista a seguir. 

Veja - O que o senhor achou da pesquisa que mostra que o cérebro tende a esquecer o que pode ser achado facilmente na internet?
Nicholas Carr - A pesquisa é fascinante. Ela mostra a enorme plasticidade do cérebro. Claro que a memória humana já passou por mu­danças com o advento de outras tecnologias de comunicação e informação, mas nunca tivemos à nossa disposição um estoque tão vasto e tão fácil de acessar como a internet. Talvez estejamos entrando numa era em que teremos cada vez menos memórias guardadas dentro do cérebro.

Veja - Quando descarta a memória fácil de recuperar e armazena a memória que pode sumir, o cérebro está sendo inteligente?
Nicholas Carr - Não. Acho isso perigoso. A perda de motivação para memorizar informações pode degradar nossa capacidade cognitiva. Na história humana, sempre guardamos memórias em lugares externos, fora do cérebro. A diferença, agora, é que a internet é imensa. O cérebro pode descartar um enorme volume de informações. Ou seja: no passado, tínhamos lugares externos para complementar nossa memória; agora, a internet pode substituir nossa memória. E um perigo. A memória fora do cérebro não é igual à memória dentro do cérebro. O que guardamos na cabeça nos permite fazer associações, conexões, aprofundar o conhecimento, elaborar, reelaborar. É isso que nos torna únicos.

Veja - Sócrates, o filósofo grego, reclamava do advento da escrita dizendo que era um estímulo ao esquecimento. A internet não é a mesma coisa, em nova escala?

Nicholas Carr - Há uma diferença importante. Sócrates reclamava do ato de escrever antes de a forma do livro ter sido inventada. Ele estava certo no estímulo ao esqueci­mento proporcionado pela escrita, mas a chegada do livro ajudou a ampliar a memória humana ao contribuir com o aumento da nossa atenção, da nossa capacidade de concentração. É possível que a internet, em algum momento no futuro, também seja complementa­da por outra invenção ou comece a ser usada de um jeito diferente, de modo a passar a exercer um papel semelhante ao que o livro teve para a escrita. Mas, examinando-se a história da internet nos últimos vinte anos, o que se vê vai na direção contrária. Cada vez mais, a maioria das pessoas usa a internet para ter acesso a informações rápidas, curtas.

Veja - O senhor acha que a internet está mu­dando nosso modo de pensar?
Nicholas Carr - Sem dúvida A internet estimula certos modos de pensar e desestimula outros. O pensamento atento, focado, concentrado é algo que ela claramente desencoraja. A internet estimula o usuário a folhear, passar os olhos, não a mergulhar com profundidade. Com a rede, nosso conhecimento está mais amplo, mas mais superficial.

Veja - Ao mudar seus hábitos on-line, o senhor conseguiu recuperar a c0ncentração necessária para ler um livro como Guerra e Paz?
Nicholas Carr - Consigo ler, mas é mais difícil do que antes. Tenho de fazer um esforço. Posso sentir minha cabeça resistindo contra ficar focada num conjunto de páginas por determinado período. Acho que, ao usar tanto meu computador para navegar na rede, acabei treinando meu cérebro para se distrair, mudar o foco, dividir a atenção rapidamente. Para ler um livro, tenho de combater esse novo instinto.

Veja - Seu artigo publicado na revista The Atlantic indagava se o Google estava nos tornando idiotas. O senhor chegou a uma resposta?
Nicholas Carr - Escrevi o artigo, mas o titulo quem deu foi um editor da revista. Eu não usaria a palavra "idiotas". No fim das contas, acho que o Google, ou a internet de modo mais geral, está nos tornando superficiais como pensadores. Trato disso no meu último livro. Em algum momento deste ano, deve ser publicado no Brasil, inclusive.

Veja - Qual a editora?

Nicholas Carr - Espere um momento ... Só um momento ...

Veja - O senhor está consultando a internet?

Nicholas Carr - Pois é, estou conferindo no site do meu livro.

Veja - Ainda bem que a internet existe, não?

Nicholas Carr - Mas acho que se eu estivesse sem acesso à internet eu conseguiria me lembrar. Está aqui, é Ediouro. .